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PARQUE TECNOLÓGICO HORIZONTES DE INOVAÇÃO

Soluções que chegam de dentro das escolas públicas

publicado: 10/04/2022 00h00, última modificação: 18/05/2022 19h14
Estudantes apresentam propostas para valorização do patrimônio histórico em edital do Ouse Criar
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Entrega da premiação do Edital Ouse Criar/ Parque Tecnológico/ foto: Delmer Oliveira/ Ascom-Seect
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Estudantes do Liceu trabalham em projeto de iluminação pública/ foto: arquivo pessoal
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Equipe da escola Antonia Rangel trabalha em projeto de habitação para o Porto do Capim/ foto: arquivo pessoal
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Márcia Dementshuk

 

Por volta dos anos de 1960, enquanto Livardo Alves “boemizava” nos arredores do Ponto de Cem Réis, em João Pessoa, a marchinha de sua autoria “Eu mato, eu mato/ Quem roubou minha cueca/ pra fazer pano de prato” animava os bailes carnavalescos pelo Brasil. Hoje, a voz de Livardo ecoa em uma súplica: “Por favor, me ajude. Estão me destruindo”. Todavia, um grupo de estudantes da Rede Pública do Ensino Médio da Paraíba compreendeu que os danos dessa destruição vão muito além da falta de conservação da estátua em homenagem ao compositor e jornalista erguida no Ponto de Cem Réis. As ruínas atingem um local onde aconteceram fatos que constroem a própria memória da Paraíba, além de serem barreiras a impedirem que a população local continue protagonizando essa história.

No ano passado, quatro estudantes do Liceu Paraibano e um da Inotech (a Escola de Inovação e Tecnologia) tinham em mãos um desafio prático lançado por meio de um programa pedagógico que estimula o aprendizado através de um conjunto de metodologias que direcionam ações visando o empreendedorismo social e sustentável. É o Programa Ouse Criar, desenvolvido pela Secretaria da Educação e da Ciência e Tecnologia da Paraíba nas escolas da rede estadual.

Arthur Veríssimo, Débora Suellen, Luís Mendonça, Vinícius Mendes atenderam ao convite da professora Larissa Vasconcelos (Liceu) e Antônio Gabriel respondeu ao chamado da professora Sueli Barreto (Inotech) para integrarem a equipe “Lupa Tech” e participarem do Edital Ouse Criar - Parque Tecnológico Horizontes de Inovação.

Este edital foi lançado em agosto de 2021. Instigava a criação de soluções inovadoras (produtos e/ou serviços) para valorizar o Patrimônio Histórico e Artístico do Centro da cidade, próximo às instalações do Parque Tecnológico Horizontes de Inovação. Foi direcionado para as sete escolas estaduais localizadas no Centro e o processo se desenrolou da seguinte maneira:

Sete professores de cada instituição - das escolas estaduais localizadas no Centro e da Inotech - mais sete graduandos da UFPB, foram selecionados por edital para serem mentores das equipes. O mentor de cada uma das sete escolas estaduais formou uma equipe. As equipes passaram por um sorteio pelo qual foram distribuídos os eixos temáticos para os quais as soluções seriam propostas: Patrimônio Histórico, Mobilidade Urbana, Iluminação Pública, Habitação, Economia, Turismo Sustentável e Segurança Pública. Tanto professores e graduandos mentores, quanto os estudantes das escolas receberam uma bolsa de estudos por seis meses (entre R$ 300,00 e R$ 800,00/mês) para desenvolverem a pesquisa. De outubro de 2021 a março de 2022, cada equipe atravessou processos técnicos de desenvolvimento de projetos. Identificaram problemas, trabalharam a ideação do projeto, o protótipo e a apresentação final, realizada no último 1º de abril, no auditório Espaço Cultural.

“Foram seis meses árduos com muita reunião, visita técnica, aplicação de questionários, relatórios. Esse programa de fato vem contribuir para uma educação além da sala de aula. Esse projeto veio para quebrar hierarquias; não tinha uma pessoa que soubesse mais do que a outra, foi uma construção coletiva, todos exerceram o protagonismo”, declarou a professora Larissa Vasconcelos, mentora da Lupa Tech, do Liceu Paraibano, cujo eixo de trabalho foi  “Iluminação Pública”. Esta equipe ficou em primeiro lugar na avaliação final e conquistou para a escola uma premiação no valor de R$ 10 mil para aquisição de um kit multimídia.

 

Projeto resgata vivência no Ponto de Cem Réis

 

Depois de aplicar questionários entre os comerciantes do Centro, trabalhadores informais e de conversar com os moradores e pessoas que frequentam o Centro, a equipe Lupa Tech entendeu exatamente o significado das palavras pintadas em uma placa de madeira, disposta ao lado da estátua feita em bronze, homenageando Livardo Alves. A estátua é uma obra do escultor Jurandir Maciel e está no Ponto de Cem Réis, em frente ao antigo Parahyba Palace Hotel, um patrimônio tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba. As palavras da placa diziam: “Por favor, me ajude. Estão me destruindo”.

Atentos a esta “silenciosa” manifestação popular, a equipe passou ao trabalho. Além de aplicar um questionário, eles investigaram a história do local onde hoje é a Praça Vidal de Negreiros e no início do século XX era uma espécie de “terminal de integração” de bondes; posteriormente foi também ponto de carros de aluguel (táxis de praça).

“Nós aprendemos que antes de ser usada como ponto final de linhas dos bondes, esse local era conhecido como a ‘Pequena África’, onde escravos, pessoas pobres, pequenos comerciantes se encontravam para jogar capoeira, dançar e tocar o coco de roda e passar algum tempo de distração”, falou Débora Suellen, integrante da equipe Lupa Tech.

“Nós vimos que o local sempre foi usado intensamente pela população, inclusive em manifestações e shows culturais. Hoje, durante o dia, é um local por onde as pessoas transitam, passam. Há shows eventuais. Mas à noite, esvazia, fica escuro e se andamos por lá nos sentimos ameaçados por alguma violência que possa acontecer. Por isso, decidimos focar a nossa solução no Ponto de Cem Réis, para, de alguma forma, resgatar a vivência, o convívio da população nesse lugar”, prossegue Débora.   

A equipe elaborou um equipamento artístico, em formato de pandeiro, para servir de suporte a placas fotovoltaicas que fornecerão energia para as lâmpadas que, por sua vez, iluminarão o monumento, a praça e o entorno. “Nós pensamos em fazer do local uma atração turística à noite, o que poderá transformar a praça. O projeto incluiu história, engenharia, designer, energias renováveis… Mas também tivemos uma noção prática do que é  fazer um projeto que pode vir a ser um empreendimento de verdade”, disse Débora.

Embora tenha havido um vencedor entre as sete equipes que participaram do edital, todos os projetos passarão pelo processo de incubação virtual no Parque Tecnológico Horizontes de Inovação. Essa é uma etapa posterior na trajetória para a implantação de startups, uma vez que os primeiros passos já foram dados. “A possibilidade de sair do mundo das ideias, do protótipo e poder concretizar esse projeto é maravilhoso porque os alunos se sentiram contemplados. Transformar ideias de estudantes de escolas públicas em um empreendimento social é revolucionário, é fantástico”, avalia Larissa Vasconcelos.

 

Novos editais estão abertos

 

“Através desse modelo que estamos empregando por meio do Programa Ouse Criar, conectado ao Parque Tecnológico Horizontes de Inovação, estamos confirmando que temos na Paraíba pessoas capacitadas para apresentarem soluções inovadoras voltadas para a valorização da nossa história, da nossa população e vislumbrando um desenvolvimento econômico e social", enfatiza Francilene Garcia Procópio, coordenadora do Programa Parque Tecnológico Horizontes de Inovação.

O edital Ouse Criar - Parque Tecnológico Horizontes de Inovação foi o primeiro edital criado nessa configuração, no âmbito dos trabalhos Parque Tecnológico Horizontes de Inovação. Depois dele, o Governo do Estado da Paraíba lançou o edital  Concurso Ideias Inovadoras – Requalificação do Centro Histórico de João Pessoa, com uma metodologia semelhante, porém mais abrangente no sentido de aceitar participantes desde escolas públicas até pesquisadores em nível de pós-graduação e empreendedores da economia criativa.

Na última semana, o Governo do Estado, por meio da Secretaria Estadual de Educação e da Ciência e Tecnologia, Fapesq e Parque Tecnológico Horizontes de Inovação (PTHI), lançou o terceiro e o quarto editais nessa linha, ligado ao Parque Tecnológico, mas com características que diferem na temática e no público apto a enviar propostas: os editais “Programa Ouse Criar – Parque Tecnológico Horizontes de Inovação: Edição Turismo e Cidades Criativas” são destinados à seleção de 10 professores(as) mentores(as) de escolas estaduais de João Pessoa e de Campina Grande e 10 graduandos(as) mentores(as) para as 10 equipes que serão formadas. As inscrições podem ser feitas até 18/04. Os editais estão acessíveis pelo site fapesq.rpp.br.

 

Outras propostas apresentam mais soluções para o Centro Histórico

 

As escolas aptas a participarem deste edital foram as sete escolas localizadas na região Central de João Pessoa, a Escola Cidadã Integral Liceu Paraibano, as Escolas Cidadãs Integrais Técnicas Olivina Olívia, Raul Machado, Luiz Gonzaga Burity, profa. Maria do Carmo de Miranda, e as Escolas Estaduais Professora Antonia Rangel de Farias e Professora Argentina Pereira Gomes. Por meio do edital foram selecionados os professores mentores, os quais formaram as equipes de estudantes. Também foram selecionados graduandos para atuarem como mentores junto às equipes e estudantes do Centro Educacional de Inovação e Tecnologia - INOTECH, também integraram as equipes.

Cada escola desenvolveu uma proposta dentro das temáticas: Patrimônio Histórico, Mobilidade Urbana, Iluminação Pública, Habitação, Economia, Turismo Sustentável e Segurança Pública do centro histórico de João Pessoa.

O trabalho com a avaliação mais alta foi da equipe Lupa Tech, do Liceu Paraibano. Eles tiveram a ideia de construir um equipamento que serviria tanto para iluminar o Ponto de Cem Réis, onde estaria localizado, quanto seria um atrativo turístico para ser frequentado à noite. Além desse, outros seis trabalhos tiveram destaque.

Na temática “Economia”, a equipe da ECIT Olivina Olívia apresentou o protótipo de um aplicativo onde estariam dispostos os serviços e produtos comercializados no Centro, facilmente acessíveis para os consumidores. É o “Ache Jampa”.

Outra ideia interessante é o “Habita Porto”, na área da Habitação, um esforço para incentivar a produção de móveis a partir do descarte de madeira que é intenso no local, por causa das fábricas que operam ali. Através de pesquisas de campo, a equipe observou que a estrutura interna das moradias e da associação de moradores era precária e que o material descartado poderia servir para fabricar móveis. A equipe era formada por estudantes da Escola Professora Antonia Rangel.

“Formulamos uma proposta usando esses recursos disponíveis e a capacitação da população para fazer esse reaproveitamento. É uma comunidade politizada, que desperta o interesse de pesquisadores, por isso há um material bibliográfico bom para pesquisa. Essa comunidade ocupa o local desde os idos anos da década de 1940; a maioria da população era de trabalhadores do antigo Porto da Paraíba. Mesmo com o deslocamento do porto para Cabedelo, as famílias permaneceram morando ali”, esclareceu a professora mentora Cláudia Sousa..

A Equipe da ECIT Professora Maria do Carmo de Miranda, cuja temática foi Patrimônio Histórico trouxe uma proposta para produção de revistas intituladas “Uma Viagem para a História”. A proposta busca trabalhar a educação patrimonial chamando a atenção do valor do patrimônio através de uma história. Cada edição aborda um local do Centro Histórico e traz um joguinho do tipo passatempo de tabuleiro, além  de figuras dos prédios e monumentos históricos que podem ser montados formando uma maquete.

O eixo Turismo Sustentável ficou ao encargo da  equipe FaNaPB - Facilitadores da Navegação. Os pontos turísticos do Centro Históricos terão informações para o turista (histórico, eventos, e outros), nos idiomas português, inglês, espanhol e libras acessíveis por meio de QRCode que estará fixado no local. Esse projeto prevê parcerias com o Departamento de História da UFPB, intérprete de libras, Cicloturismo (projeto que oferece bicicletas para o turista) e o banco Itaú, que também aluga bicicletas).

Como solução para a mobilidade urbana, os estudantes da Escola Estadual Professora Argentina Pereira Gomes apresentaram uma solução para o grande número de carros que circulam no Centro: o incentivo ao uso da bicicleta em ciclovias. A proposta também pensa na segurança dos ciclista e no transporte sustentável. A ciclovia interligaria o Parque Solón de Lucena e o Parque tecnológico Horizontes de Inovação, na Praça Dom Ulrico. As  bicicletas teriam uso integrado ao cartão de passagem de ônibus e também equipamento para carregar o celular do ciclista. A via teria pontos de acesso gratuito à internet.

E por fim, na área da segurança pública, a equipe “Seguranças da Inovação” da ECIT Luiz Gonzaga Burity aplicou questionários junto à população da região e constatou que dois terços dos entrevistados estão descontentes com a segurança pública na região. A solução viria por meio de totens de monitoramento com câmeras de alcance 360º para auxiliar o trabalho da polícia. O cidadão dispõe de acesso à central de segurança. O Tótem é alimentado por meio de energia solar fotovoltaica e poderá também recarregar baterias.