Notícias

Pesquisa Internacional

Projeto Bingo busca respostas para os segredos do universo

publicado: 18/10/2020 15h37, última modificação: 19/10/2020 16h07
Objetivo é entender as propriedades da energia escura e se debruçar sobre a aceleração da expansão do universo
Radiotelescópio Bingo

Radiotelescópio será erguido no município de Aguiar, Sertão da Paraíba (Imagem Projeto Bingo)

 

Por Márcia Dementshuk

Marte, Vênus, Mercúrio; a Lua… Na rua à noite, sob um céu sem nuvens, distante das luzes das cidades, é como o cenário dos filmes de romance, o casal se aproxima e ao fundo está o rastro esbranquiçado da Via Láctea. Os astros se descortinam aos olhos parecem tão perto, mas estão distantes a milhões de anos-luz.
As estrelas visíveis da Terra são parte de uma das cerca de duas trilhões de galáxias que acredita-se existir no Universo. O telescópio Hubble coletou dados por 20 anos para revelar essa quantidade aproximada; um número tão grande que nos leva à ideia de infinito. Cada uma com milhões, bilhões de astros atraídos uns aos outros pela gravidade. Olhos humanos não alcançam.
O cosmos é uma das grandes incógnitas para as pessoas. A cada resposta encontrada surgem mais duas, três, cinco perguntas! Antigos filósofos babilônicos, egípcios, gregos… A história da humanidade é permeada pelas questões astronômicas até os dias atuais.
O homo sapiens acumulou conhecimento sendo capaz de construir máquinas geniais que calculam extensas equações, detectam ondas eletromagnéticas e guardam milhões de dados. Com tal domínio, é possível buscar algumas respostas com mais acurácia. É isso que o Projeto BINGO propõe.
“O BINGO trará respostas sobre o cosmos”, explica o físico Amílcar Rabelo, colaborador internacional do Projeto BINGO. “Sabemos que o Universo está em expansão, e essa expansão está acelerada; o que provoca a aceleração dessa expansão é a energia escura, mas não sabemos o que é a ‘energia escura’. Este nome reflete exatamente essa ausência de conhecimento. E o principal objetivo do Projeto Bingo é entender as propriedades dessa energia, se debruçar sobre a aceleração da expansão do Universo.”

Expansão é causada pela energia escura

 

Os físicos que estudam cosmologia concordam que o Universo está em expansão. Desde o Big Bang - o início de tudo - essa expansão pode ter sido mais rápida, ou mais lenta em determinados períodos, ainda não se sabe. Os cientista já descobriram que a força causadora dessa expansão é uma energia, mas as características dessa energia ainda são desconhecidas, por isso ela foi chamada de “energia escura”. “Ela é composta por elementos desconhecidos da ciência até hoje”, esclarece Amílcar Rabelo.
Boa parte dos pesquisadores descartam a ideia de explosão do Big Bang. O fato teria sido, sim, uma expansão inicial muito veloz de elementos que, ao mesmo tempo, se atraíam para formar a matéria - os corpos celestes, as galáxias. Tudo o que se conhece do Universo - e o que não se conhece -, estava no ponto inicial e está se expandindo. O Universo parte de uma singularidade, de um ponto, e vai expandindo sem parar.
A expansão ocorre entre as galáxias, entre as grandes concentrações de matéria, não entre os corpos que compõem as galáxias. Na Via Láctea, os planetas e suas luas, estrelas, cometas, não sofrem essa expansão; eles gravitam. Mas a Via Láctea está se afastando de galáxias vizinhas. É como fazer pontos em um balão (bexiga) vazio; ao encher, o balão se expande e os pontos se distanciam uns dos outros.
A descoberta acerca da expansão é atribuída ao astrônomo Edwin Hubble que publicou a teoria como artigo científico em 1927 em uma revista pouco lida pelos cientistas do meio, por isso acabou ignorado. Contudo, outros cientistas chegaram à conclusão originalmente proposta por Hubble e justiça foi feita designando o nome à “Teoria de Hubble”. Mas a comunidade de cientistas acreditava que a expansão estaria gradativamente mais lenta desde o Big Bang; até que em 1998 grupos de astrônomos demonstraram o contrário: está acelerando-se sob influência da energia escura. Então, novas perguntas surgem: Desde quando? Como se comporta essa energia?

BINGO irá mapear galáxias no Universo

 

Projeto BINGO executa programas de divulgação científica entre estudantes do Ensino Médio (Imagem Projeto BINGO)


Uma das formas de investigar o Universo é através das ondas eletromagnéticas emitidas por elementos que estão no cosmos. Um deles é o hidrogênio, tão familiar aos seres humanos, o número 1 da Tabela Periódica. Lá no cosmos os átomos de hidrogênio neutro emitem ondas de rádio (radiação) possíveis de serem captadas da Terra por radiotelescópios.
O radiotelescópio Bingo vai detectar a radiação emitida por átomos de hidrogênio e mapear onde eles se concentram. Onde for detectado um grande volume de radiação, é sinal de que ali há hidrogênio, por conseguinte, há matéria, ou seja, galáxias.

Diagrama esquemático da história do universo: BINGO irá focar em período mais recente do Universo
O BINGO vai apontar para um período determinado na “linha do tempo” (indicado no diagrama da evolução do Universo) em uma período do tempo bem na borda do "copo". E fará um mapa da radiação desse recorte. Esse mapa terá cores indicando onde estão concentradas as matérias (as galáxias). Com esse mapa em mãos, será relacionado o mapa feito pelo Bingo com outros experimentos, com outros mapas, para ver como essas concentrações evoluem. As galáxias estarão no mesmo lugar? Ou em lugares próximos? Qual a distância?
Dessa forma será possível calcular a ação da energia escura - a velocidade responsável pela aceleração da taxa de expansão do Universo.

“Com várias imagens de recortes em pontos diferentes no tempo será possível montar um filme dessas modificações e visualizar como estão ocorrendo. Isso trará mais esclarecimentos sobre a energia escura, nos ajudando a entender a evolução do Universo hoje e até projetar no futuro”, ressalta Amílcar Rabelo.

O projeto Bingo será um dos primeiros a fazer isso nessa faixa de tempo; será um feito inédito no mundo científico. É uma comprovação acurada da Teoria da Expansão do Universo.
Radiotelescópio será construído no Sertão da Paraíba

Radiotelescópio será construído na Paraíba

 

BINGO é o acrônimo em Inglês para “Baryon Accoustic Oscillation In Neutral Gas Observations” ou Oscilações Acústicas de Bárions em Observações de Gás Neutro. É um projeto de colaboração científica internacional, liderado no Brasil por Élcio Abdala, o coordenador geral, pesquisador na USP, onde é desenvolvida a parte de computação (simulações) e será feito o processamento de dados. A montagem das peças, os receptores chamados de “Corneta”, é realizada no Instituto de Pesquisas Espaciais sob a coordenação de Carlos Alexandre Wuenschel e outras peças são desenvolvidas na Universidade Federal de Campina Grande, com a coordenação de Luciano Barosi.
Está orçado em R$ 20 milhões; a maior parcela é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo, Fapesp (R$ 13 milhões e US$ 1 milhão), pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (R$ 1 milhão); FINEP (R$ 3 milhões); Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba, a Fapesq (R$ 369 mil - PRONEX), além de equipamentos eletrônicos que serão fornecidos pela China. Conta com o apoio de instituições de pesquisa da China, Reino Unido, França, Uruguai e África do Sul.
Será construído na Serra do Urubu, na cidade de Aguiar, no Sertão da Paraíba, longe das metrópoles e da poluição eletromagnética, em uma área de cerca de 60 metros quadrados. A altura do radiotelescópio é como a de um prédio de 20 andares; certamente transformará a paisagem na Caatinga em Aguiar e irá proporcionar desenvolvimento tecnológico e científico na região e no Estado da Paraíba.