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PM usa inteligência artificial e ‘Internet das Coisas’ na PB

publicado: 02/08/2019 17h29, última modificação: 03/01/2020 10h56
Projeto com base tecnológica testado no São João de CG evolui para combate ao furto de celulares na Paraíba
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Ideia adotada pela equipe de Segurança nasceu a partir de uma pesquisa de mestrado desenvolvida na UEPB
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Jimmy Felipe conta que iniciou o projeto de biometria facial em 2017
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O economista Jorge Gomes se dirigiu à catraca, passou pela revista por detectores de metais e entrou no Parque do Povo, em Campina Grande, para prestigiar o “maior São João do mundo”. Ele não percebeu que cada movimento seu era gravado por 265 câmeras de segurança, distribuídas em locais estratégicos. A ação de reconhecimento facial de imagens dessas câmeras, empregada pela Polícia Militar, culminou na prisão de 11 foragidos durante o período da festa. A novidade é que no próximo ano, Jorge Gomes poderá curtir o São João com mais tranquilidade, sem medo de ter seu celular furtado; a tecnologia permitirá descobrir onde irão parar os celulares furtados (isso, se algum ladrão se atrever!).

Esse projeto digital para a segurança pública nasceu a partir de uma pesquisa de mestrado na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). A reportagem entrevistou Jimmy Felipe, Policial Militar e autor da dissertação pelo Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional, que integra o Centro Multiusuário de Estudos Avançados em Políticas Públicas e Governança.

Os resultados das ações de segurança pública durante o são João de Campina Grande apresentam números impressionantes. “Na verdade, foram feitas 12 apreensões, ou com quebra do regime (não deveriam estar frequentando locais públicos) ou com o mandado de prisão em aberto”,  revela Jimmy. “Mas um desses casos é inédito na literatura criminal no Brasil. A  leitura facial identificou o irmão gêmeo do acusado. A polícia ainda trabalha nesse caso. Entre os onze presos, havia uma mulher, extremamente maquiada. Mesmo assim, o sistema a reconheceu. Outro tentou um disfarce usando um chapéu grande com óculos, sem sucesso. Acabou na cadeia.”

O São João de Campina é, realmente, grande. Jorge Gomes foi um dos cerca de um milhão e 600 mil visitantes que passaram pelas catracas do Parque do Povo do dia 7 de junho à madrugada do dia 8 de julho. É a maior festa contínua no Brasil, numa área extensa (2 hectares). A inteligência artificial, base do sistema de biometria facial, também foi usada na contagem do público, feita através de câmeras posicionadas nas entradas, onde estavam as catracas. Cada pessoa que entrava, contava-se um, e cada pessoa que saía, subtraía-se um do total. Esse procedimento forneceu com precisão o número de participantes a cada dia da festa.

Mesmo diante desse espectro, a redução dos incidentes registrados pela PM, na área do evento, foi de 85%, comparado a 2018. E a população aprovou a operação: o Instituto de Pesquisa Datavox revelou que o monitoramento por câmeras recebeu a aprovação de 95,7% dos entrevistados. O evento foi seguro para 60,7% e extremamente seguro para 23,9%.

Jimmy Felipe conta que iniciou o projeto de biometria facial em 2017 e apresentou-o na terceira edição da Expotec – Feira e Congresso de Tecnologia, realizada em João Pessoa. Dando seguimento, a apresentação foi feita aos superiores da Polícia Militar, que desenvolveram uma operação piloto para o São João de 2018. Com o sucesso obtido, os procedimentos foram totalmente implementados no Parque do Povo e arredores, em 2019.

“A dissertação trabalha com a integração de redes e sensores para a segurança pública. Num primeiro momento, as informações estão isoladas. Tenho os dados da polícia de um lado, os dados das centrais de inteligência, de outro; e, durante a festa, estou gerando novas informações, organizadas em outro banco de dados. A integração desses dados é o que resultará nas informações que precisamos para partir pro trabalho de campo, que é perseguir o acusado e prendê-lo. E avaliação dessas informações é o trará melhorias para a segurança pública”, explica Jimmy Felipe.

O policial, formado em Direito, continua dizendo que “o rigor da vida acadêmica foi o que permitiu fazer essa propositura para a vida profissional. Essas informações têm uma perspectiva prática e também uma perspectiva acadêmica para o desenvolvimento de melhorias e novas aplicações”.

  

Celulares serão dispositivos com sensores permitindo a localização pela polícia

 

 Cada pessoa que entrava no Parque do Povo teve a biometria realizada na sua face. As imagens foram direcionadas a um servidor; o servidor fazia o recorte da cabeça, e enviava para outro servidor usando algoritmos de inteligência artificial que, supervisionado por pessoas, fazia o comparativo com a base de dados formada com documentos da Polícia Militar da Paraíba e de outros estados, e dos serviços de inteligência. Assim que ocorria uma identificação, a informação era passada para as equipes de policiais militares e do Corpo de Bombeiros, pelo radiocomunicador.

Jimmy Felipe foi o coordenador da central de monitoramento, construída exclusivamente para o momento da festa e depois, desmontada. Diariamente, 10 policiais Polícia Militar e sete dos Bombeiros se revezavam no acompanhamento das câmeras.

“A novidade é que nesse ano, testamos uma avaliação com sensores para combater o furto de celulares. A área do Parque do Povo possuía rede de Internet. O visitante podia escolher se queria se conectar à rede, ou não. A partir do momento em que ele se conectava à rede, o endereço utilizado por aquele celular passava a ser monitorado. Caso o celular fosse furtado, tínhamos condições de acompanhar o local onde estivesse”, revela Jimmy Felipe. O experimento foi executado em torno de 10 mil celulares, um número modesto, para o tamanho do público, mas para teste de tecnologia, foi o suficiente.

A evolução nessa integração ocorre fazendo com que o celular seja um sensor integrado à rede do Parque à qual, por sua vez, é integrada à da polícia. A integração dá condições de trabalhar na perspectiva da segurança pública: mesmo que todos os dados do celular sejam deletados pelos ladrões, formatando os softwares do aparelho, a polícia tem condições de localizá-lo. “Isso é fantástico”, comenta o economista Jorge Gomes. “E o mais legal é que esse mesmo sistema poderia ser usado em outros lugares da cidade, no Centro, em praças, não é?”

Essa é a perspectiva do policial Jimmy Felipe: “Não ouvimos tanto falar em Internet das Coisas? Essa é uma de suas aplicações”. Essas experiências podem ser transformadas em política pública para outros eventos e para outras áreas de convivência das cidades.

O monitoramento da segurança por vídeo será implementado pelo Governo do Estado em João Pessoa, Campina Grande, Patos e em pontos nas divisas de estados. De acordo com o Governador João Azevêdo, o projeto prevê a instalação de 1300 câmeras que estarão dispondo de informações desde a identificação de placas de veículos, até reconhecimento facial.

 

Centro Multiusuário de Pesquisa propõe ‘gestão pública baseada em evidência’

 

Num momento em que o debate em torno da Segurança Pública está nos noticiários da Paraíba, fomentado pelo 13º Fórum Brasileiro de Segurança Pública, realizado na semana passada, no Centro de Convenções, em João Pessoa, a aplicação da biometria facial em ações de segurança na Paraíba demonstram o quanto a tecnologia é, cada vez mais, uma aliada.

Não só na segurança, mas no processo de convívio social como um todo. “Esses desenvolvimentos em tecnologia estão mais próximos do que imaginamos. O importante é identificar que problema público pode se beneficiar com essa integração?”, questiona o professor Cláudio Lucena,  vinculado ao Centro Multiusuário de Estudos Avançados em Políticas Públicas e Governança da UEPB, em Campina Grande – uma iniciativa da Secretaria Estadual de Educação e da Ciência e Tecnologia da Paraíba (SEECT).

Entre os propósitos do Centro, Lucena avalia que “nosso objetivo número 1 é instrumentalizar o Executivo e o Legislativo da Paraíba para a construção de políticas públicas. De que forma: levantando dados. Isso evita as impressões subjetivas, que podem estar equivocadas. Estamos trabalhando em dados para indicar aos gestores públicos uma quadro mais completo das necessidades do Estado. Essa é a ‘gestão pública baseada em evidência’; um procedimento que dá trabalho aos órgãos do Estado e do Legislativo, porque esse é um trabalho de pesquisa, e a universidade tem essa força de pesquisa”.

Outra vertente do centro é o que entende-se como governança com relação aos novos fatores advindos do avanço da tecnologia. “Como iremos regular atividades que as pessoas não exerciam? O carro autônomo: é uma realidade. Quais serão as normas para esse tipo de mobilidade? E o uso de drones?”, aponta Cláudio Lucena. Ainda não há regulamentação específica para o uso de biometria facial. O Centro está executando um estudo em cima desse e de outros problemas. “Estamos fazendo um mapa visual de áreas regulatórias voltadas à tecnologia”, explica o professor.