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LITERATURA

Pesquisa em escrita criativa é tema de live da FapesqPB nesta segunda

publicado: 23/05/2021 00h00, última modificação: 24/05/2021 11h05
Assis Brasil, professor pioneiro na área é um dos convidados no canal do YouTube da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba
Divulgação

Ana Marinho e Assis Brasil são debatedores da live; Tiago Germano é o mediador/ fotos: divulgação; Douglas Machado; divulgação

 

 

 

Renato Félix

 

Todo mundo aprende a escrever na escola, claro. Mas dá para aprender a ser escritor? A criatividade soa muitas vezes como um dom místico, que algumas pessoas têm e outras não e que não se pode ensinar ou aprender. Mas há 36 anos, Luiz Antonio de Assis Brasil começou a ministrar uma oficina de escrita criativa na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), que evoluiu para uma pós-graduação. Ele vai falar sobre essa área de pesquisa como um dos convidados da Live Fapesq, que será transmitida ao vivo nesta segunda, às 17h, no canal no YouTube da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba. Também participam os professores Ana Marinho, da UFPB, e Carlos Magalhães, da UEPB. A mediação será do escritor e jornalista Tiago Germano.

A live tem como tema “A expansão da escrita criativa como área de pesquisa”. “A ideia é a gente conversar sobre a escrita criativa como área de pesquisa dentro das letras, estabelecendo pontes entra as instituições de ensino superior daqui (UFPB e UEPB) e a PUC-RS, visando a possibilidade de um futuro cenário de cooperação acadêmica entre elas”, explica o mediador. “Assis Brasil vai falar da experiência da criação da pós-graduação na área lá na PUC-RS, que é a instituição pioneira da escrita criativa aqui no Brasil, tendo criado um mestrado e um doutorado na área a partir da oficina de escrita criativa que ele conduz há mais de 30 anos, lá na instituição”.

Assis Brasil criou a oficina há 36 anos e é autor do livro “Escrever Ficção – Um Manual de Criação Literária”. “Estou trabalhando com ela durante todo esse tempo de maneira ininterrupta”, conta. “Em certo sentido, eu tive que criar uma metodologia. Porque nós não tínhamos modelos. E eu criei a oficina usando minha experiência de escritor com a minha experiência de professor. Eu já era professor havia 10 anos – só não trabalhava com escrita criativa, naturalmente”.

Se o tema é “ensinável” ou “estudável”, pode ser uma boa pergunta. “Eu já parti de um princípio que isso era “estudável”. Não “ensinável”, mas “aprendível”, comenta. “Eu não sei se a gente ensina a escrever – exceto as técnicas literárias. Mas, antes de tudo, pode ser aprendido. E se aprende, antes de tudo, lendo, lendo, lendo muito – é a principal receita. E, em segundo lugar, escrevendo, escrevendo, escrevendo muito, ouvindo os outros e, se possível, frequentando um curso de escrita criativa ou mesmo uma oficina informal. Todos esses elementos fazem parte da aprendizagem do escritor”.

“O que eu vou fazer”, diz, sobre sua participação na live, “vai ser um histórico de como ocorreu esse processo na minha universidade. E também posso falar de uma ou outra experiência que tenha acontecido, como o Instituto Vera Cruz, que tem uma especialização, a Católica de Pernambuco... Aqui e ali começam a surgir algumas experiências. O tempo é que vai consolidar”.

“Acho que ainda há mesmo muitas confusões quando a gente tá falando de escrita criativa. Muita gente no mercado fala de escrita criativa como se ela fosse somente um tipo de escrita que fosse além do critério técnico (como a escrita jornalística ou acadêmica, por exemplo), sem enxergar as potencialidades que a área possui”, alerta Tiago Germano. “Essa resistência também é uma resistência dos escritores, que são muito adeptos à hierarquização da arte literária, e pensam na escrita criativa como uma ‘subcategoria’ da escrita literária. Acho que a live vai ser importante pra que os professores possam comentar essas confusões”.

Para Germano, a escrita criativa abre um grande leque de possibilidades dentro do estudo das letras. “Faz com que os pesquisadores possam trabalhar não apenas com questões diretamente ligadas à escrita literária (ao escrever ficção, por exemplo), mas também ao mercado, à cadeia produtiva da literatura (trabalhando não apenas com oficinas de criação mas também edições de livros, preparação de originais, revisão, agenciamento de autores, etc)”, pontua.

 

 

Interesse cresce na UFPB

 

Para a professora Ana Marinho, da UFPB, existe um interesse crescente na área na universidade paraibana. “Principalmente quando identificamos entre os nossos alunos do curso de Letras uma inquietação em relação à formação profissional”, conta. “Muitos alunos procuram os cursos de licenciatura em Letras em função de um interesse nos processos de escrita literária, muitos deles imaginam que o curso irá formar romancistas, poetas, dramaturgos. Contudo, nossos cursos estão voltados para a formação de professores, aspecto que termina por ‘decepcionar’ os estudantes, principalmente nos primeiros períodos do curso”.

Assim, o Programa de Pós-Graduação em Letras, do qual Ana Marinho já foi coordenadora, ofertou este semestre uma disciplina intitulada “Escrita criativa/literária no ensino e literatura”, ministrada pelo professor visitante Rildo Cosson. “A discussão sobre escrita criativa no âmbito da pós-graduação ainda é embrionária, principalmente quando levamos em conta a organização dos programas de pós em áreas de concentração e linhas de pesquisa”, explica ela. “A disciplina mencionada foi ofertada na linha de pesquisa ‘Leituras literárias’, que se volta para aspectos relacionados à recepção das obras literárias e também para o ensino de literatura”.

Já o professor Carlos Magalhães, da UEPB, tem uma perspectiva diferente e menos animadora. “O Programa de Pós-graduação em Literatura e Interculturalidade da UEPB não tem nenhuma área ou linha de pesquisa voltada para a escrita criativa, e pelo perfil e histórico do nosso programa, não pretenderá abrir âmbitos de pesquisa com essa temática”, afirma. “Na área não vejo um interesse crescente, ainda que possam existir pessoas interessadas. Ocupar o espaço numa área acadêmica deve ser sempre fruto de pesquisa e publicações”.

 

 

Curso abre leque importante na área

 

Assis Brasil conta que a evolução da oficina de escrita criativa, um projeto de extensão, para a pesquisa na pós-graduação da PUC-RS foi natural. “Foi criada uma linha de pesquisa. Depois, essa linha de pesquisa foi transformada numa área de concentração, que é como se encontra agora”, explica. “Então nosso Programa de Pós-Graduação em Letras tem três areas de concentração: a linguística, a teoria da literatura e a escrita criativa. Por enquanto, somos os únicos que temos tudo isso, mas eu não me orgulho disso, porque eu queria que isso estivesse expandido para todo o país e para todas as universidades. Porque me parece um caminho natural e inevitável para as universidades, a criação desses cursos”. A PUC gaúcha também possui um curso de graduação em Escrita Criativa.

A pós atraiu Tiago Germano, jornalista de formação, mas que, naquele momento, tinha aspirações literárias (atualmente está a caminho da publicação de seu segundo romance). Ele e Débora Ferraz, também jornalista e hoje também escritora, foram cursar juntos no Rio Grande do Sul. “A gente procurava um horizonte profissional na área acadêmica, mas necessariamente fora do jornalismo, porque queríamos nos dedicar à literatura...”, conta ele. “O mestrado e o doutorado na área nos possibilitou isso e é o que acho que de mais valioso que a área pode proporcionar: antigamente quem queria ser escritor tinha que procurar Letras ou Jornalismo, ou outra profissão que pouco tivesse a ver com a escrita ficcional. Uma graduação em Escrita Criativa, por exemplo, me abriria, ainda na época da graduação (se houvesse), naquela época, uma perspectiva de trabalhar com algo ligado à criação literária: oficina, edição, revisão, preparação de originais, etc”.

O universo acadêmico da escrita criativa ainda pode ser alvo de alguma desconfiança, o que, para Assis Brasil, não faz sentido e cai facilmente. “A resistência maior é que todo mundo saia escrevendo igual”, aponta ele. “Eu digo: peguem autores que saíram da minha oficina, por exemplo, e comparem os livros entre eles. Vamos ver se todos escrevem da mesma forma. É tão simples de ser desmentido isso...”.

Para ele, a discussão é inútil: o que vale é a qualidade da obra no final. “Se ela derivou de um processo de frequência a uma escola, digamos, a uma oficina, isso é outra questão, que diz respeito somente ao autor. O que interessa é se tem qualidade estética, é isso que nós temos que pensar”, diz.

O professor, pioneiro no Brasil, lembra também que a área de pesquisa está se solidificando no mundo, em universidades europeias, por exemplo. “Nas americanas, faz bastante tempo, foi depois da II Guerra que começou”, conta. “Mas há também na África do Sul, na Nova Zelândia, na Austrália, que tem um belíssimo trabalho de escrita criativa nas universidades... Em Cuba, já tem há muito tempo, também. É algo absolutamente vitorioso no mundo inteiro. Cada vez ficam mais inconsistentes as críticas aos cursos de escrita criativa”.