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Pesquisadores da PB desenvolvem máscara que mata o coronavírus
Cerca de 40 pesquisadores atuam no Laboratório Certbio - UFCG
Por Márcia Dementshuk
Pesquisadores do Laboratório de Avaliação e Desenvolvimento de Biomateriais do Nordeste (Certbio), da Universidade Federal de Campina Grande, desenvolveram uma máscara cirúrgica biodegradável, com material capaz de reter o vírus da covid-19 (SARS-CoV-2) e matá-lo. A máscara é descartável mas tem durabilidade segura de até 24 horas seguidas de uso.
O projeto “Proteção no Combate à Covid-19: Inovação no desenvolvimento de Máscara Cirúrgica” foi uma das 18 propostas selecionadas no edital lançado por meio da Fundação de Apoio à Pesquisa da Paraíba, no início da crise de saúde causada pela epidemia do coronavírus na Paraíba. Foi uma iniciativa emergencial do Governo do Estado da Paraíba, através da Secretaria de Estado da Educação e da Ciência e Tecnologia, com o objetivo de apoiar a pesquisa científica e encontrar soluções para o problema. Os recursos totais para os projetos são exclusivamente do governo estadual e ganharam um aporte da Assembleia Legislativa da Paraíba. Somam R$ 2 milhões.
Na experiência desenvolvida no Certbio foi aplicado um elemento chamado quitosana no material da máscara, um biomaterial que atua como bactericida, fungicida e agora os pesquisadores comprovaram que é um virucida. O custo final desse elemento em cada unidade não passa de R$ 0,10. Está escrito corretamente: dez centavos.
A quitosana é obtida de exoesqueletos (esqueleto externo) de crustáceos, insetos ou fungos. A matéria prima usada pelo Certbio é o camarão, facilmente encontrado na costa nordestina; além disso, a Paraíba tem a maior usina de beneficiamento de camarão do Nordeste. É um elemento com potencial para o desenvolvimento econômico da a região.
Ao contrário de outros materiais comumente usados em máscaras cirúrgicas, a quitosana é biodegradável. “Ao invés de ‘brigarmos’ com a natureza, estamos nos aliando à ela e oferecendo defesa à sociedade a partir da própria natureza”, afirma o coordenador da pesquisa, professor Dr. Marcus Vinícius Lia Fook.
“Nos últimos 4 meses nós produzimos mais quitosana aqui no laboratório do que em dez anos! O ambiente ficou imunizado. Como somos da área da saúde, a equipe desse projeto, com sete integrantes, trabalha no laboratório nesses quatro meses de isolamento social sem que nenhum de nós tenha sido infectado até o momento. Nós somos o exemplo do que estamos dizendo: a quitosana tem propriedade virucida”, garante Marcus Vinícius.
O cientista deixa claro que a quitosana não trata a covid-19. Ela auxilia porque não permite que o vírus passe por ela. É um bloqueio químico. A máscara, por si só, é um bloqueio físico. Com a quitosana, ganha um reforço químico.
Sem a quitosana, o vírus bate na barreira física e retorna vivo para o ambiente. Se ele encontrar onde se fixar e tiver condições de sobreviver ali, poderá infectar alguém desavisado. Com a quitosana é diferente. Se o vírus passar perto da quitosana ele será atraído a ela e não encontrará condições de sobreviver. Morre. É exterminado. Em resumo: a quitosana tem a capacidade de capturar o vírus e não dá a ele ambiente propício para permanecer ativo.
O único ambiente de beneficiamento de casca de camarão para a produção de quitosana “grau médico” - que tem uso médico, com condições de pureza e controle de fabricação - é em Campina Grande, no Certbio. E a maior planta para produzir quitosana sem ser grau médico é no Ceará.
Além das máscaras, o Certbio desenvolveu também uma quitosana em gel que, diferente do álcool em gel, também é virucida. Higieniza as mãos com uma ação mais prolongada sem os aspectos negativos do álcool em gel, que resseca as mãos. Pelo contrário, ele não só protege como rejuvenesce as mãos. Do ponto de vista da pesquisa, o produto está pronto e em breve deverá ser distribuído para os hospitais da Paraíba.
A população terá acesso a essa tecnologia indiretamente. Segundo Marcus Vinícius, uma empresa da Paraíba está interessada em aplicar essa tecnologia em leitos hospitalares, nas roupas de cama, nos utensílios e aparelhos, o que dará uma proteção adicional. Da mesma forma, a empresa está interessada na produção das máscaras para distribuição hospitalar, não só na Paraíba, mas em outros estados.
Pesquisador diz que país precisa produzir para garantir segurança em saúde
O coordenador do projeto, Marcus Vinícius Lia Fook, reflete sobre a pandemia e retoma o histórico dos acontecimentos no Brasil e na Paraíba com relação à dificuldade de aquisição de equipamentos de proteção para as equipes de saúde.
A maior parte desses equipamentos eram importados da China por vários países; com aumento da demanda houve escassez, os preços aumentaram e muitas máscaras estavam fora das especificações.
Esse problema ocorreu, inclusive, na Paraíba. No início da implantação da quarentena, em março, o estado importou máscaras para suprir os hospitais; quando o material chegou, os profissionais da saúde observaram que não era de boa qualidade. Houve uma interferência do Ministério Público do Trabalho da Paraíba com recomendação ao Governo do Estado para avaliação dessa compra; dessa forma, as máscaras foram recolhidas, enviadas para o Certbio, testadas e avaliadas.
Foi necessário a readequação de 4.500 máscaras que receberam mais camadas de proteção; um trabalho executado no próprio Certbio. A negociação do restante do material foi suspensa. Desde então, qualquer máscara a ser usada na Paraíba passa antes por uma avaliação avaliação no Certbio.
Para Marcus Vinícius, desenvolver tecnologia e produzir no país é o que irá garantir segurança em saúde para a população: “O Brasil teve um déficit na balança comercial em 2019 superior a US$ 12 bilhões, na área de saúde. Do ponto de vista econômico, a política cambial favoreceu esse número, com o dólar baixo, estava vantajoso comprar no exterior. Mas a pandemia mostrou que saúde é uma questão estratégica, de segurança nacional, que não pode depender de fornecedores externos.”
Por volta de 2008, o Ministério da Saúde criou uma política exclusiva para incentivar o fortalecimento do complexo industrial da Saúde no Brasil. O Certbio é um desses laboratórios, sediado na Paraíba, bem como o Núcleo de Tecnologias Estratégicas em Saúde (Nutes/UEPB), e outros no País. “Até o momento, o Ministério da Saúde esteve mais voltado para o setor de fármacos. A partir desse ano de 2020, terá que deslocar a atenção para a área de materiais de uso em saúde. É tecnologia, transformar a pesquisa em produtos para fortalecer um sistema que é exemplar no mundo que é o Sistema Único de Saúde”, avalia o pesquisador.
Laboratório possui Acreditação do INMETRO para testes
Entre estudantes da iniciação científica, mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos, em torno de 40 pesquisadores trabalham no Certbio em projetos acadêmicos (iniciação científica, dissertações de mestrado e teses de doutorado); já foram qualificados na área de saúde mais de 55 profissionais - a maioria médicos que atuam na rede pública e privada não só na Paraíba como também de Pernambuco e do Rio Grande do Norte. Além disso, há quatro projetos em desenvolvimento com parceiros privados. São pesquisas na parte de tecido duro para osso, cimento ósseo e enchimento ósseo, que colocarão a Paraíba em uma posição de destaque na área tecnológica.
Em polímeros - no caso, a quitosana - o Certbio tem desenvolvido membranas de quitosana usadas no Hospital Universitário Alcides Carneiro, em Campina Grande para o tratamento de úlcera diabética, auxiliando na cicatrização de feridas em diabéticos.
O laboratório é um dos três no Brasil com a Acreditação do Inmetro para a realização de testes em próteses mamárias, é um reconhecimento em âmbito internacional em eficiência das práticas de ensaio que o Certbio possui.
A máscara cirúrgica desenvolvida no Certbio com o incentivo do Governo do Estado da Paraíba é de nível 1, que protege de partículas. O projeto prevê a produção de 10 mil máscaras e distribuição nos hospitais da Paraíba. Outra classificação é a de nível dois, que protege de gotículas, também em desenvolvimento no Certbio, em parceria com a Universidade de Brasília. A máscara de nível 3 oferece proteção radiológica, em casos de fazer Raio-X, ou outros exames. Este é um projeto futuro, na lista do laboratório.