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Sustentabilidade

Solução sustentável para o lixiviado tem bons resultados

publicado: 02/02/2020 11h57, última modificação: 03/02/2020 11h20
Na UEPB, pesquisadores desenvolvem tratamento de esgoto gerado de resíduos sólidos descartados com baixo custo
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Pesquisador Valderi Duarte. Foto: Givaldo Cavalcanti
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Equipe Extrabes - Codecom - UEPB. Foto: Givaldo Cavalcante
Divulgação
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O destino dos resíduos sólidos – o lixo – é um problema constantemente prorrogado no Brasil. O País tem uma Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) instituída há uma década, mas os prazos para a construção de aterros sanitários com tratamento do lixiviado (chorume) e outros tópicos não são cumpridos pelos municípios, deputados propõem no Congresso Nacional prorrogações e a falta de soluções se arrasta. Era para ser 2014.

A PNRS foi sancionada em 2 de agosto de 2010 e estabelecia até o final de 2014 o prazo para que as prefeituras se adequassem às novas regras. Em julho de 2015, o Senado estendeu a data-limite para o fim dos lixões.

Pela nova regra, até 31 de julho deste ano termina o prazo para cidades com população entre 50 e 100 mil habitantes resolver essa questão. Os municípios com menos de 50 mil habitantes, devem estar de acordo com a lei até 31 de julho de 2021. E as capitais e regiões metropolitanas, os municípios de fronteira e os que contam com mais de 100 mil habitantes? Bem, já era… O prazo encerrou em 2019. Na Paraíba, a Promotoria do Meio Ambiente do Ministério Público Estadual tem estado encarregada de cobrar essa execução dos Prefeitos.

Contudo, a situação do lixo não se resolve nem quando o município implementa o aterro sanitário quando o faz parcialmente, sem operar de forma satisfatória a reciclagem dos materiais reutilizáveis ou a inclusão dos serviços dos catadores. Surgem novos problemas. Ainda por cima, há outro resíduo gerado pelo lixo que preocupa e é líquido: o chorume, o esgoto do lixão, do aterro sanitário, dos resíduos. Na Paraíba cada pessoa gera, me média, 1 litro de lixiviado por dia (Fonte: Extrabes).

Em meio a esse desafio gigante, como fala o pesquisador Valderi Duarte Leite, da UEPB, o lixiviado, nome técnico para o chorume é o detrito mais tóxico, mais poluente e mais difícil de ser tratado para ser devolvido à natureza. Valderi Duarte é coordenador do Laboratório Multiusuário de Pesquisa e Análise de Água, Alimentos, Resíduos e Biodiversidade, ligado à Universidade Estadual da Paraíba, onde a Estação Experimental de Tratamento Biológico e Esgoto Sanitário (Extrabes) está instalada. A Extrabes integra o Centro Multiusuário, o programa do Governo da Paraíba que amplia as capacidades de pesquisas de laboratórios em operação no estado.

A Extrabes tem realizado a caracterização química de lixiviado de aterro sanitário de João Pessoa e identificado várias substâncias químicas extremamente tóxicas. Já foram identificadas 157 compostos químicos de diferentes origens e resistentes, além de uma série de elementos químicos como o chumbo, mercúrio, cromo, níquel, arsênio e demais outros.

O lixiviado de aterro sanitário é detentor de elevada concentração de nitrogênio amoniacal (um amoníaco) e cerca de 95% dos sólidos totais do lixiviado se encontram em forma dissolvida, o que dificulta ainda mais o tratamento.

 

O que fazer com o Lixiviado?

 

Estudos para conhecer mais profundamente o lixiviado e formas de tratá-lo antes de descartar ao meio ambiente são recentes. As características do lixiviado começaram a ser pesquisadas no Brasil em 2008, através de um projeto financiado pela Finep (Financiadora de Estudos e Projetos). “Formamos uma rede com nove instituições de pesquisa de vários estados e começamos a pesquisa do zero. Não havia um nome padrão; ‘lixiviado’ é o termo traduzido para o português, usado internacionalmente”, contou o pesquisador Valderi Duarte Leite, da Extrabes.

Determinou-se que cada um em suas cidades caracterizariam o lixiviado. “Eu fui escalado para realizar o processo de dessorção de amônia’, é um procedimento químico para retirar do meio líquido a fração denominada de gás amônia, que é uma substância química altamente tóxica. Lixiviado é muito rico em nitrogênio amoniacal. O esgoto doméstico, por exemplo, tem algo em torno de 50 miligramas por litro de nitrogênio amoniacal. No lixiviado dos aterros operados no Brasil, a concentração de nitrogênio amoniacal chega ao patamar de 2.500 miligramas por litro. É impossível iniciar qualquer tratamento biológico com essa concentração de nitrogênio amoniacal”, informa Valderi.

 

Remoção do Nitrogênio Amoniacal para tratar

 

O nitrogênio amoniacal presente no lixiviado, poderá ser encontrado em duas formas que são, a forma molecular e a forma iônica e estas duas formas somadas totalizam a concentração do nitrogênio amoniacal, que foi objeto primeiro do estudo da Extrabes.

“Construímos uma torre de dessorção e realizamos os ensaios para eliminação do nitrogênio amoniacal (aplicamos o princípio da operação unitária denominada dessorção).

Este processo foi muito bem sucedido em termos de eficiência, haja vista que em um tempo de 3 horas ser reduzida a concentração de nitrogênio amoniacal de 2.500mg/L para 100 mg/L. Porém, o custo ficou bastante elevado, algo em torno de R$153,00 por metro cúbico de lixiviado. E qual a razão deste custo? Gasto com base, com energia elétrica e com ácido.

Em resumo: o processo foi bem sucedido, porém seria necessário resolver a questão do custo.

Depois de muitas horas de discussão, o grupo chegou à conclusão de que este mesmo processo poderia ser realizado em “reatores de fluxo horizontal aberto”. Precisava ser materializada na prática. Valderi duarte Leite continua:

“Em um primeiro momento foram realizados ensaios de bancada e constatamos que a nossa ideia do RFHA (reatores de fluxo horizontal aberto) poderia ser concretizada. Então construímos os RFHA (cinco reatores em série) com 5 metros de comprimento e 1 metro de largura.”

“Estabelecidos os parâmetros operacionais, iniciamos o monitoramento do sistema, acreditando na química, na bioquímica, na microbiologia, na engenharia e nos deuses!”

Com estas valiosas contribuições e com a garra, competência e determinação dos pesquisadores e pesquisadoras envolvidas diretamente na realização deste trabalho de pesquisa, o processo de dessorção de nitrogênio amoniacal foi efetivado com eficiência superior a 90% e custo de R$ 0,50 por metro cúbico de lixiviado.

“O Brasil, o Nordeste e a Paraíba precisam conhecer estes trabalhos que foram e estão sendo realizados por pesquisadores e pesquisadoras da UEPB”, destaca Valderi Duarte

 

Parque tecnológico é solução para aterro sanitário e tratamento de esgotos

 

O pesquisador Valderi Duarte Leite é incisivo ao afirmar que aterro sanitário não resolve o problema do lixo urbano. Apenas o tira do meio da rua e confina. “As pessoas não enxergam, mas estamos envolvidos num desafio complexo. Nós, a população, temos que sair dessa configuração de aterro sanitário. Não tem como esse país se segurar aterrando matéria orgânica, aterrando plástico, aterrando papelão. Tem que fazer compostagem e reciclagem. O aterro seria destino para 10% dos resíduos que nós geramos e não têm outro uso”.

“Na prática, a solução é fazer um parque tecnológico para tratar água; um sistema que mistura o lixiviado com o esgoto doméstico. Trata-se todo o montante antes de descartar no meio ambiente. O problema é que as configurações atuais desses sistemas estão equivocadas. Por exemplo, o aterro sanitário de João Pessoa está a seis quilômetros de distância do tratamento de esgotos domésticos. O ideal é ter uma estação unificada. A lógica é essa. Estação de tratamento de água, esgotos, resíduos, tudo próximo para potencializar o esforço e viabilizar financeiramente.